Trecho do livro TARDE

OP. CIT., PP.164-65 "No poema moderno, é sempre nítida uma tensão entre a necessidade de exprimir-se uma subjetividade numa personalíssima voz lírica e, de outro lado, a consciência crítica de um sujeito que se inventa e evade, ao mesmo tempo ressaltando o que há de falso em si próprio - uma postura cínica, talvez, porém honesta, pois de boa- fé o autor desconstrói seu artifício, desmistifica-se para o 'leitor- irmão...'" Hm. Pode ser. Mas o Pessoa, em doze heptassílabos, já disse o mesmo - não, disse mais - muito melhor. MATINAL Nesta manhã de sábado e de sol em que o real das coisas se revela na forma nada transcendente de uma paisagem na janela num momento captado em pleno vôo pela discreta plenitude de não ser mais que um par de olhos parado no meio do mundo tantas coisas se fazem conceber fora do tempo e do espaço até que o instante se dissolva enfim em mil e um pedaços feito esses furos de pregos numa parede vazia a insinuar uma constelação isenta de qualquer mitologia.