Trecho do livro LISBOA

O QUE O TURISTA DEVE VER Sobre sete colinas, que são outros tantos pontos de observação de onde se podem disfrutar magníficos panoramas, espalha-se a vasta, irregular e multicolorida massa de casas que constitui Lisboa. Para o viajante que chega por mar, Lisboa, vista assim de longe, ergue-se como uma bela visão de sonho, sobressaindo contra o azul vivo do céu, que o sol anima. E as cúpulas, os monumentos, o velho castelo elevam-se acima da massa das casas, como arautos distantes deste delicioso lugar, desta abençoada região. O espanto do turista começa quando o barco se aproxima da barra e, depois de passar o farol do Bugio - a pequena torre-guardiã na embocadura do rio, construída há três séculos sobre planta de Frei João Turriano - lhe aparece o baluarte que é a Torre de Belém, como um exemplar magnífico da arquitectura militar do século XVI, em estilo romano-gótico-mourisco (vide página 139). À medida que o barco avança, o rio torna-se mais estreito, para logo alargar de novo, formando um dos mais largos portos naturais do mundo, podendo nele ancorar as maiores frotas. Então, à esquerda, as massas de casas agrupam-se vivamente como cachos sobre as colinas. E aí temos Lisboa. Desembarcar e fácil e relativamente rápido; costuma fazer- se num ponto da margem onde abundam os meios de transporte. Um trem, um automóvel ou então um simples eléctrico conduzirá o estrangeiro em poucos minutos ao centro da cidade. Ao desembarcar, tudo lhe é facilitado e, quanto a funcionários, descobre que os há invariavelmente educados e prontos a darem-lhe todas as indicações que possa pedir, quer se dirija aos funcionários da Alfândega ou aos do porto, ou mesmo à Guarda Fiscal. No exterior da Alfândega há um pequeno posto de controle que vem mesmo a propósito, pois controla o transporte de bagagens, para prevenir os abusos que, sem isso, seriam inevitáveis onde quer que fosse, em tais circunstâncias. Este posto despacha bagagem para qualquer parte da cidade e assume a responsabilidade pela entrega. Os funcionários são competentíssimos e falam várias línguas. Convidaremos agora o turista a vir connosco. Servir-lhe-emos de cicerone e percorreremos com ele a capital, mostrando-lhe os monumentos, os jardins, os edifícios mais notáveis, os museus - tudo o que for de algum modo digno de ser visto nesta maravilhosa Lisboa. Depois de a sua bagagem ter sido confiada a um bagageiro de confiança, que a entregará no hotel se o turista ficar por algum tempo, deixemo-lo tomar o seu lugar connosco num automóvel e seguir para o centro da cidade. Pelo caminho mostrar-lhe-emos tudo o que merece ser visto. Mesmo em frente do cais que lhe fica ali à esquerda é a Rocha de Conde de Óbidos, uma elevação coroada por um bem tratado jardim a que se acede por duas largas escadas de pedra; do cimo desse mesmo jardim tem-se uma bela vista sobre o rio. Seguindo ao longo da Rua 24 de Julho, passamos pelo Jardim de Santos (ou Jardim Vasco da Gama) e logo a seguir pelo Jardim da Praça de Dom Luís, onde está a estátua de bronze de um dos heróicos chefes das lutas liberais, o Marquês de Sá da Bandeira; este monumento, esculpido por Giovanni Ciniselli, foi fundido em Roma, e a base feita em Lisboa por Germano José de Salles, tendo sido erigido em 1881. Um pouco mais adiante, e depois de passar o belo edifício onde estão instalados os serviços da Assistência Nacional aos Tuberculosos, fundados pela Rainha D. Amélia, permitam-nos mencionar esta praça que se estende ao longo do rio; à esquerda fica o monumento ao Duque da Terceira, que libertou Lisboa do governo absolutista, e à direita uma pequena mas interessante estátua de mármore representando um marinheiro ao leme. Este monumento deve-se ao escultor Francisco dos Santos, e o do Duque ao escultor Simões de Almeida. Ali perto situa-se a estação de caminho de ferro provisória da linha de Cascais, e à beira-rio o cais para os pequenos vapores que cruzam o Tejo. Há também aqui uma praça de automóveis de aluguer. O nosso automóvel vai andando, percorre a Rua do Arsenal, e passa junto à Câmara Municipal, um dos mais belos edificios da cidade. É notável não só pelo seu exterior como também pelo seu interior e deve-se ao arquitecto Domingos Parente, sendo visível a colaboração de famosos artistas, na cantaria, nas pinturas, etc. A monumental escadaria que conduz ao primeiro andar é digna de ser vista, especialmente no que se refere às magníficas pinturas que decoram as paredes e o tecto; e as várias salas do edifício são também nobremente decoradas com frescos e telas de Sequeira, Columbano, José Rodrigues, Neves Júnior, Malhoa, Salgado, etc., representando figuras históricas e outras, havendo uma grande pintura de Lupi figurando o Marquês de Pombal e a reconstrução de Lisboa por ele efectuada depois do grande terramoto, assim como bustos dos melhores escultores, fogões artísticos, mobiliário, etc. No meio do largo poderemos ver o Pelourinho, muito bem conhecido no estrangeiro; é uma obra-prima do século XVIII, com a forma de uma espiral, feita de um único bloco de pedra. Do lado direito deste largo, veremos, ao passar, o Arsenal da Marinha, um vasto edifício englobando, além do arsenal e das oficinas - que, com a doca, estão do lado do rio e portanto invisíveis para nós -, a Escola Naval, fundada em 1845, e o Tribunal da Relação, em cujas salas podem ser admirados alguns belos exemplares de antiga tapeçaria. Estão também instalados neste edifício outros serviços públicos de menor importância. Mais adiante, numa ala diferente do edifício, dando para o lado da Câmara, estão os Serviços de Correios e Telégrafos, ainda que só a entrada para a Posta Restante fique desse lado. Chegamos agora à maior das praças de Lisboa, a Praça do Comércio, outrora Terreiro do Paço, como é ainda geralmente conhecida; esta é a praça que os ingleses conhecem por Praça do Cavalo Negro e é uma das maiores do mundo. É um vasto espaço, perfeitamente quadrado, contornado, em três dos seus lados, por edifícios de tipo uniforme, com altas arcadas de pedra. Os principais serviços públicos estão todos aqui instalados - os Ministérios (excepto o dos Negócios Estrangeiros), os Serviços de Correios e Telégrafos, a Alfândega, a Procuradoria Geral da República, o Serviço de Emigração, o Tribunal Administrativo, os serviços centrais da Cruz Vermelha, etc. O quarto lado, ou lado Sul, da praça é bordejado pelo Tejo, muito largo neste sítio e sempre cheio de embarcações. No centro da praça fica a estátua equestre de bronze do Rei D. José I, uma esplêndida escultura de Joaquim Machado de Castro, fundida em Portugal, de uma só peça, em 1774. Tem catorze metros de altura. O pedestal é adornado com magníficas figuras representando a reconstrução de Lisboa depois do grande terramoto de 1755. Há uma figura segurando um cavalo que esmaga o inimigo sob as patas, outra com as insígnias da Vitória, a Fama num outro grupo; e o conjunto é verdadeiramente notável. Além disso, podemos aí ver as Armas Reais e o retrato do Marquês de Pombal, assim como uma alegoria que representa a Generosidade Real levantando Lisboa das ruínas. O monumento, acessível por degraus de mármore, é circundado por altas grades alternando com colunas. Do lado Norte da praça, perpendiculares ao rio, há três avenidas paralelas; a do meio parte de um magnífico arco triunfal de grandes dimensões, indubitavelmente um dos maiores da Europa. É datado de 1873 mas foi projectado por Veríssimo José da Costa e começado a construir em 1755. O grupo alegórico que coroa o arco, esculpido por Calmels, personifica a Glória coroando o Génio e o Valor; as figuras reclinadas, que representam os rios Tejo e Douro, assim como as estátuas de Nuno Álvares, Viriato, Pombal e Vasco da Gama, são da autoria do escultor Vítor Bastos. [...]