Trecho do livro CONTOS DE GIGANTES

O BOBO E O GIGANTE Há muito tempo, quando os bichos falavam e as montanhas eram mais altas, uma mulher tinha três filhos: um corajoso, um inteligente e um bobo. O bobo era bobo porque era o menor e os mais velhos se divertiam mexendo com ele. Um dia, o filho corajoso levou as ovelhas a um campo perto de uma montanha. No caminho encontrou uma raposa-vermelha. Deu uma pedrada nela e seguiu em frente. Na encosta da montanha, estava um gigante. O corajoso levantou o cajado e gritou: - Saia já daí! O gigante não disse nada. Pegou uma pedra e a esmagou entre os dedos, como se fosse um biscoito. Com uma risada estrondosa, jogou os farelos no corajoso, que correu para casa, esquecido das ovelhas. - Mãe, mãe - o corajoso disse, ainda tremendo -, um gigante desceu da montanha! - E as ovelhas? - Deixei lá. Ele esmagou uma pedra e... - Ai, ai, ai, o gigante vai devorar nossas ovelhas - a mãe choramingou. - Eu vou lá, mãe - o filho inteligente disse. Pegou uma corda e se foi. No caminho, encontrou a raposa-vermelha. Deu uma pedrada nela e seguiu em frente. Quando chegou na encosta da montanha, o gigante tinha devorado cinco ovelhas e estava dormindo à sombra de uma rocha. Roncava como uma trovoada. O esperto amarrou as mãos e os pés do gigante. Mas, quando começou a chamar as ovelhas, o gigante acordou, arrebentou a corda e berrou: - Deixe as minhas ovelhas, seu fracote! Então pegou uma pedra e a esmagou entre os dedos, como se fose um biscoito. Com uma risada estrondosa, jogou os farelos no esperto, que correu para casa, esquecido das ovelhas. - Mãe, mãe - o esperto disse, ainda tremendo -, não consegui enganar o gigante! - E as ovelhas, meu filho? - Cinco foram devoradas. - Ai, meu Deus, não vai sobrar uma - a mãe choramingou. - Eu vou lá, mãe - o filho bobo disse. - Vai, não. Se seus irmãos não conseguiram nada, você vai conseguir? Mas o bobo não ouviu os conselhos da mãe. Foi para o campo. No caminho, deu com a raposa-vermelha e se alegrou: - Mas que linda raposinha. - Olá - a raposa disse. - Quer meter medo no gigante? - Claro que quero. Então a raposa-vermelha explicou como. O bobo voltou e pediu um pouco de manteiga para a mãe. Ela não queria dar. Ele insistiu. O corajoso disse: - Desde quando manteiga dá coragem? O esperto disse: - O gigante vai comer esse bobo frito na manteiga. Mas o bobo insistiu até conseguir a manteiga e voltou para o campo. O gigante tinha comido outras cinco ovelhas e palitava os dentes com um galho de pinheiro. Ao ver o bobo, menor que os outros dois irmãos, disse: - E você, nanico? O que quer? - As ovelhas. - Olhe o que eu faço com você se se meter com as minhas ovelhas - o gigante disse e pegou uma pedra, esmagando-a entre os dedos, como se fosse um biscoito. - Olhe o que eu faço com você - o bobo disse, mostrando a manteiga. Apertou-a até que foi aquela meleca por entre os dedos. - Você consegue fazer mingau de pedra? O gigante achou que não tinha visto direito e coçou a cabeça, pensativo: - É, o nanico é fortinho. Quer trabalhar comigo? Pago cem moedas de ouro por dia. - Aceito. - Mas com uma condição. Todo dia tem uma prova. Se não me vencer, eu como você com salada de agrião. - Combinado. - Amanhã cedo vamos dar um soco nessa rocha. Quem conseguir enterrar a mão mais fundo será o vencedor. Agora pode levar as ovelhas. Mas volte em seguida, para dormir aqui. Senão eu vou buscar você e sua família. O bobo tratou de levar logo as ovelhas, louco de medo. No caminho encontrou a raposa-vermelha. - O que foi, rapaz? Por que chora? O bobo contou a aposta feita com o gigante. A raposa disse: - Não se preocupe. De noite, quando o gigante dormir, eu ajudo você. Em casa, a mãe e os irmãos ficaram muito admirados: - Como você conseguiu as ovelhas de volta? - Meti medo no gigante. - Não acredito - o corajoso disse. O bobo voltou para o campo. Quando o gigante dormiu, a raposa fez com o focinho um furo bem fundo na rocha. Depois o tapou com pó-de-pedra misturado com resina de pinheiro. Pela manhã, o gigante deu um bocejo que sacudiu os galhos das árvores. - Levante-se, nanico! Vamos à prova. Vou eu primeiro ou vai você? - Vou eu - o bobo disse. O bobo foi até a rocha e deu um soco na parte colada com resina. Seu braço entrou até o cotovelo no buraco. - Agora é a sua vez. O gigante achou que não tinha visto direito e coçou a cabeça, pensativo. - É, o nanico é fortinho. Mas veja isto. E deu um tremendo soco na rocha. Só que o braço do gigante entrou apenas até o punho, sem falar que ele ainda quebrou três dedos. - Você me venceu - o gigante disse, e tirou de uma bolsa de pele de tigre as cem moedas de ouro. - Amanhã temos outra prova. Vamos ver quem de nós dois come mais batatas. Pode ir. Mas volte para dormir, senão já sabe: vou até sua casa e acabo com todos. O bobo tratou logo de pegar as moedas. Quase não conseguia carregá-las: as moedas do gigante eram gigantes também, do tamanho de uma bandeja. O bobo estava rico com apenas um dia de trabalho. Mesmo assim foi louco de medo pra casa. No caminho encontrou a raposa-vermelha. - O que foi, rapaz? Por que chora? O bobo contou a aposta feita com o gigante. A raposa disse: - Não se preocupe. De noite, quando o gigante dormir, eu ajudo você. Em casa, a mãe e os irmãos ficaram muito admirados: - Como você conseguiu tanto ouro? - Enganei o gigante. - Não acredito - o esperto disse. O bobo voltou para o campo. Quando o gigante dormiu, a raposa deu para o bobo o estômago de um boi e explicou o que ele tinha de fazer. Pela manhã, o gigante sacudiu os galhos das árvores com um bocejo. - Levante-se, nanico! O gigante tinha feito uma mesa com os troncos de cinco pinheiros e cozinhara dez sacos de batatas num caldeirão do tamanho de um elefante. Sentou-se à mesa e gritou: - Vamos à prova, nanico! O bobo, com o estômago do boi por dentro da camisa, foi para a mesa. O gigante encheu dois pratos de batatas. Começaram a comer. O bobo comia uma batata e botava dez para dentro do estômago do boi. O gigante nem olhava, ocupado em comer. A cada prato comido, ele contava, no seu vozeirão: - Um pra mim, um pra você. Dois pra mim, dois pra você. Quando já tinham comido cinqüenta pratos de batatas, as contas começaram a fazer diferença. - Cinqüenta pra mim - o gigante berrou -, cinqüenta e dois pra você. Quando o gigante chegou a setenta pratos de batatas, o bobo tinha chegado a oitenta e sete. O gigante, vendo a aposta perdida, começou a engolir as batatas sem mastigar, um prato depois do outro. Então começou a passar mal. Esfregava a barriga estufada e gemia: - Ai, ai, ai, ai, minha barriguinha. - Reconhece a derrota? - o bobo disse. - Reconheço. - O gigante tirou da bolsa de pele de tigre outras cem moedas de ouro. - São suas. [...]