Um bom conselho de alguém com mais experiência é sempre bem-vindo quando iniciamos em uma área ou carreira. Em um saber complexo e que gera reações tão acaloradas quanto a psicanálise, se deparar com três conselhos de Marco Antonio Coutinho Jorge – referência nacional e internacional no assunto – é uma grata surpresa.
Neste abril, Mês da Psicanálise, em que Zahar e Companhia das Letras se juntam para celebrar a psicanálise em todas as suas formas – das obras clássicas de Freud e Lacan a lançamentos recentes –, pedimos a Marco Antonio Coutinho Jorge que enumerasse ensinamentos fundamentais para iniciantes.
Psicanalista e médico psiquiatra, Marco Antonio Coutinho Jorge é professor associado do Instituto de Psicologia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), onde leciona no Programa de Pós-Graduação em Psicanálise. Autor, dentre outros, da tetralogia Fundamentos da Psicanálise: de Freud a Lacan, Coutinho Jorge é diretor da Seção Rio de Janeiro do Corpo Freudiano, além de membro da Association Insistance (Paris) e da Sociedade Internacional de História da Psiquiatria e da Psicanálise.
Marco Antonio Coutinho Jorge, autor da tetralogia Fundamentos da Psicanálise (foto: Chico Cerchiaro)
Confira as dicas abaixo:
1. A psicanálise não é um saber passível de ser ensinado como uma apostila de vestibular.
Por isso, a formação de um psicanalista é algo muito sério e inclui duas experiências fundamentais: a análise pessoal e o estudo teórico. Uma terceira dimensão, igualmente fundamental, vai se somar posteriormente à formação, à medida que o iniciante começa a clinicar: a supervisão clínica.
Assim se constitui o chamado tripé clássico da formação analítica, reconhecido universalmente pelas mais diferentes escolas de psicanálise.
Este é o mapa da formação analítica, mas é claro que o estudo da psicanálise não implica necessariamente o desejo de se dedicar à clínica. A psicanálise é estudada por diferentes especialistas das mais variadas disciplinas – literatura, direito, antropologia, filosofia, linguística, entre outros.
2. O estudo teórico de quem se dedica à prática psicanalítica assume uma dimensão própria, que denomino de travessia da teoria, acompanhada necessariamente da travessia da fantasia que, segundo Lacan, é uma conquista da análise pessoal.
Nada disso é simples e a complexidade em jogo requer de cada analista a criação de caminhos próprios e originais. O desejo de saber é o que move os analistas em suas interrogações e pesquisas.
Quem estuda psicanálise deve ter sempre em mente que a teorização em psicanálise é feita essencialmente através de insights analíticos, oriundos da própria experiência analítica dos analistas (pessoal e com seus analisandos) e não de uma reflexão intelectual, por mais refinada e elaborada que ela seja.
Assim, há um fértil caminho de mão dupla a ser percorrido em todo este processo de estudo, no qual a experiência da análise é, na verdade, o lugar onde a teoria analítica adquire seu pleno sentido.
3. Estudar a obra de Freud com afinco e dedicação.
Além dessa rápida explanação, a dica principal para quem inicia é esta.
Essa obra, fruto da análise e da experiência clínica de seu criador – a Interpretação dos sonhos é constituída em parte significativa pela análise dos sonhos de Freud –, mantém a transmissão da psicanálise sempre viva.
Por ser uma obra feita através de poderosos insights, em suas páginas Freud sempre tem alguma mensagem importante para seus leitores, muitas vezes de elevado teor poético. E seu estudo sempre revela surpresas maravilhosas que vão nos introduzindo, aos poucos, àquilo que nos constitui sem que o saibamos: o inconsciente.
Conheça a coleção Fundamentos da Psicanálise:
- vol. 1: As bases conceituais
- vol. 2: A clínica da fantasia
- vol. 3: A prática analítica
- vol. 4: O laboratório do analista