Nem criança, nem adolescente: o que lê a galera dos 9 aos 12 anos?

22/04/2024

Dizem que os primeiros sete ou oito anos da infância são mágicos. E que a adolescência é uma fase de ebulição. Mas e quem não está nem lá nem cá? 

A faixa etária dos nove aos doze anos é um pouco esse limbo de não ser pequeno nem grande - e de, eventualmente, pender para ambos os lados.

A primeira infância, que dura mais ou menos até os sete anos, é aquela fase de puro encantamento e descobertas genuínas. A linha entre o que separa fantasia de realidade tem contornos indefinidos. Por isso, é muito gostoso e fácil acreditar em seres mitológicos, em contos de fadas, no Papai Noel e no Coelhinho da Páscoa. Depois disso, aquele limite entre o universo encantado e o real, que era tão tênue, vai ficando mais definido.

Conforme o crescimento avança, as crianças vão compreendendo mais o mundo em que vivem: o que é verdade, o que é imaginação e o contexto que as cerca com todas as suas imperfeições, como a pobreza, a violência, a desigualdade. Elas começam a entender que nem o mundo nem as pessoas são assim tão perfeitas - nem mesmo o pai, a mãe ou a professora, que antes pareciam tão infalíveis... E vão também descobrindo e entendendo de uma maneira muito intensa alguém muito especial: elas mesmas. Quem são e do que gostam?

Junto desse processo de autoconhecimento, surge a vontade própria, a autonomia que permite realizar muitas atividades por conta própria - acompanhada do sentimento de que não precisam dos adultos para tudo. De pequenos, passam a querer se grandes: a desejar independência e a enxergar o que há no mundo para além do núcleo familar. Se descortina um universo novo, imenso e  - não raro - um pouco assustador.

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Mas aí é que vem a vantagem de estar nessa fase “do meio”. Como a infância está ali, ainda bem pertinho, e a adolescência, em si, não chegou, dá para se refugiar nos dois cantos quando for preciso. Dá para folhear aquele livro ou assistir àquele filme que trazia tanto conforto “quando eles eram pequenos”. Dá pedir um colinho ou um abraço bem apertado na hora de dormir. Mas também dá para mandar os pais para longe, concentrar mais atenção nas amizades e até querer ficar mais sozinho, para (tentar) entender todas as mudanças que começam a surgir.

O que acontece com os pré-adolescentes?

É nesse “meio termo”, entre infância e adolescência, que vai dos nove aos 12 anos, que muitas transformações começam a acontecer no desenvolvimento da mente e do corpo dessas crianças - não há consenso fechado sobre quando começa a pré-adolescência; segundo a Organização Mundial da Saúde, ela vai dos 10 aos 14 anos, mas a entrada nessa fase varia de criança para criança, sendo que algumas sentem o início das transformações antes, a partir de 8 ou 9 anos. “É um momento de tomada de consciência sobre as ambivalências e as incoerências da vida. Há um certo desencatamento, que é necessário para o crescimento”, explica a psicóloga e psicanalista Fê Lopes, co-autora do podcast Psy(co), especialista em Psicanálise da Parentalidade e da Perinatalidade.

O corpo também é palco (do início) de várias transformações. “As mudanças físicas começam a nos mobilizar: a gente cheira diferente, não cabe mais nas mesmas roupas, alguma meninas começam a ter broto mamário crescido... Isso tudo faz um rebuliço dentro da criança que ora reage como um adolescente, ora reage como uma criança, e nem sempre sabe por que está desse ou daquele jeito”, aponta a psicóloga. Esse salto físico e no comportamento vai ficando cada vez mais visível. 

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As crianças passam a querer mais momentos de individualidade, a gostar de outras atividades e leituras. “Também é um momento em que os pais estranham os filhos, que talvez passem a não rir mais das piadinhas de antes. E comecem a se interessar mais pelo grupo de amigos do que pelos programas familiares. A família também precisa se adaptar”, diz a especialista. Sim, os pais também ficam nesse “meio termo”: ao mesmo tempo em que precisam ir soltando a criança aos poucos, eles ainda são necessários. “É um processo, cheio de idas e vindas, trabalhoso. E sabemos disso porque seguimos sofrendo para lidar com algumas questões até hoje - o que rende aquela imensidão de memes sobre os perrengues da vida adulta”, aponta a psicóloga.

O que pré-adolescentes de 9 a 12 anos gostam de ler?

As preferências que aparecem na hora de escolher livros, séries ou filmes, também refletem esse crescimento e esses primeiros movimentos na conquista de uma autonomia mais signifcativa. “A cultura tem um papel importante para o ser humano elaborar seus conflitos e questões e também para transmitir valores”, diz a psicóloga. Não poderia ser diferente em uma fase com mudanças tão significativas. Nesse momento, o gosto pessoal passa a ter mais a ver com a descoberta de quem aquela criança é e passa a receber novas influências, que vão além do núcleo familiar, apenas. “Os temas mudam um pouco e a influência dos grupos de amigos passa a ser importante. ‘O que meus amigos estão lendo?’, ‘Qual livro foi indicado por alguém que eu admiro?’”, exemplifica a especialista.

Mas ninguém melhor do que as próprias crianças, que estão nessa faixa etária em que acontecem tantas transformações, para contar do que gostam. O que leem? Que títulos procuram? Quais são os melhores livros para pré-adolescentes?  Confira as respostas delas:

"Os livros que mais gostei até o momento são O conde de Monte Cristo, de Alexandre Dumas, Frankenstein, de Mary Shelley, e A ilha misteriosa e Vinte mil léguas submarinas, os dois últimos de Jules Vernes. Algumas das coisas que mais me atraem em um livro são a boa escrita e uma boa sinopse. Prefiro ler livros mais ‘maduros’, por falta de palavra melhor, porque sinto uma falta de compreensão, por parte dos autores, dos sentimentos ou da mentalidade de crianças da minha idade, que, apesar de não serem tão maduras quanto um adulto, por exemplo, não são tão infantis como retratam a maioria dos livros. Quando bem escritos, alguns dos temas que me atraem mais são ficção científica, horror e romances.”
Enzo Catuogno Arthuzo, 12 anos

Enzo leu e gostou das obras abaixo:

O conde de Monte Cristo, Alexandre Dumas (Clássicos Zahar)

O conde de Monte Cristo

 

Frankesntein, Mary Shelley (Clássicos Zahar)

Frankenstein, Mary Shelley

 

20 mil léguas submarinas, Jules Vernes (Clássicos Zahar)

20 mil léguas submarinas

 

“Gosto quando as histórias falam da escola, de amigos e de situações que acontecem ou poderiam acontecer também na minha escola. Eu também amo livros de história e de curiosidades, que explicam coisas que eu não sabia.”
Marina Deolindo, 10 anos

Maria talvez curtisse livros como os dois volumes de Implacáveis, repleto de informações curiosas sobre a história da humanidade, e O círculo, que trata de amizade e conflitos, e Vote Nelas, em que cinco amigas se unem para disputar as eleições no grêmio da escola 


Implacáveis: como nós conquistamos o mundo (Companhia das Letrinhas), Yuval Noah Harari

Implacáveis: como nós conquistamos o mundo (Companhia das Letrinhas), Yuval Noah Harari

 

Implacáveis: por que o mundo não é justo - vol. 2 (Companhia das Letrinhas), de Yuval Harari

Capa de Implacáveis: por que o mundo não é justo, segundo volume da coleção de Yuval Harari


O círculo: conversando a gente se entende (Escarlate), Carolina Nalon

 

Vote nelas (Escarlate), de Maisa Diniz, Renata Miwa, Carla Mayumi e Pedro Markun
 

Capa do livro Vote nelas, em que cinco garotas disputam eleições para o grêmio da escola

“Eu gosto de livros de magia, de aventura, de história, ficção. Gosto de livros que falam coisas de pré-história e de ciências, que é a minha matéria favorita. Amo filmes com magos, bruxas e escola de magia, castelos, fadas, poções, reinos. Gosto de histórias em que os personagens viajam pelo mundo.”
Mateus Araújo, 10 anos

Mateus poderia gostar de O livro dos porquês, que traz muitas curiosidades científicas, ou então Puffy e Brunilda, livro sobre bruxas da Barbara Cantini.


O livro dos porquês (Companhia das Letrinhas), Ciência Hoje das Crianças

O livro dos porquês

Puffy e Brunilda: uma pitada de magia (Companhia das Letrinhas), Barbara Cantini

Capa do livro Puffy e Brunilda, de Barbara Cantini, sobre bruxas e magia

“Gosto de histórias de suspense e de amizades. Ah, de fantasia eu também gosto muito! Mas os meus livros e filmes favoritos são mesmo os que falam de amizade.”
Theodora Abrahão, 11 anos

Crianças com os mesmos gostos de Theodora podem se encantar por Laila e Jasmim, que retrata o amadurecimento, a amizade e os desafios que enfrentam duas meninas de 11 anos, o livro Passa anel, que mistura amizade, um anel mágico, profecia e prova de matemática, e Hilda e o Troll, que propõe uma incrível viagem pela imaginação 

 

Laila e Jasmim (Escarlate), de Guilherme Semionato

Capa do livro Laila e Jasmim, de Guilherme Semionato, que retrata a amizade das duas meninas

 

Passa anel (Companhia das Letrinhas), de Fits e Nicole Janér

Capa de Passa anel, livro sobre mistério, amizade e um anel mágico

 

Hilda e o Troll (Quadrinhos na Cia), de Luke Pearson

Capa do livro Hilda e o Troll, um convite à fantasia e aventura


“Os livros que eu mais gosto de ler são HQs porque dá para imaginar melhor o personagem, na minha opinião. Então, isso me prende. Eu gosto muito de romance, aventura, adoro livros de imaginação. Também gosto muito de mangá porque prefiro livros relacionados à imagem. O que me prende é o desenrolar da história e as reviravoltas. Tipo, um livro de suspense... Sabe quando a mocinha ou um personagem que quase não interage, de repente, é o vilão?”
Alice Maxiline, 11 anos

De quadrinhos, recomendamos os livros do Clube do Pepezinho, que já está na quarta edição e é sempre muito divertido. Para uma boa história de suspense, Alice pode gostar de Salvos por um fio, sobre as férias num sítio cheio de mistérios, ou A mágica mortal, o livro para pré-adolescentes de Raphael Montes

 

Clube do Pepezinho (Companhia das Letrinhas), Dav Pilkey

 

Salvos por um fio (Escarlate), de Silvana Rando

Capa de Salvos por um fio, uma história de mistério e folclore, escrito por Silvana Rando

 

A mágica mortal (Seguinte), de Raphael Montes

Capa de A mágica mortal, de Raphael Montes para pré-adolescentes

“Gosto de livros de contos de fadas, quando são livros grandes. Mas eu adoro alguns outros livros, mesmo que sejam bem pequenos. Tem livro que não é tão grande, mas não é tão pequeno. E tem livros que você até interage no final. É bem legal!”
Cecília Maxiline, 9 anos

Para crianças como Cecília, indicamos os quatro livros de Janaina Tokitaka pela coleção Canoa, que trazem releituras divertidas e modernas dos contos de fadas e as infinitas possibilidades de existir de Ser o que se é, de Pedroca Monteiro e Daniel Kondo

Bela, a fera, e Fernão, o belo (Companhia das Letrinhas), Janaina Tokitaka

Bela, a fera, e Fernão, o belo

 

Ser o que se é (Companhia das Letrinhas), Pedroca Monteiro e Daniel Kondo


“Eu gosto muito dos livro da Pilar. Tenho dois, eu já terminei um e eu estou lendo o outro. O primeiro, eu achei muito legal, da China. O segundo livro é da Amazônia, que ainda não terminei. Mas já escutei umas três lendas de lá e gostei muito. Teve uma história que me deixou com medo, mas, depois, fiquei rindo. Acho que é importante te contar que eu tenho TDL, que significa Transtorno do Desenvolvimento da Linguagem. Ninguém sabia que eu ia conseguir, mas eu leio muito bem - e adoro. Sou viciada. Não consigo parar”
Heloísa Shirazi, 9 anos

Heloísa já leu dois livros da coleção Diário de Pilar, mas ainda tem muito mais aventura esperando: Pilar na Índia, África, Egito, Grécia, Machu Picchu...

Diário de Pilar na China (Pequena Zahar), Flávia Lins e Silva


Diário de Pilar na Amazônia (Pequena Zahar), Flávia Lins e Silva

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