Fernando Pessoa, mais que um poeta, foi vários. Para muitos leitores, ele é mais conhecido como o criador de múltiplos "heterônimos". Mas a recente revelação de centenas de inéditos vem ressaltar a importância da obra poética que ele assinou com seu próprio nome.
Fernando Pessoa, mais que um poeta, foi vários. Para muitos leitores, ele é mais conhecido como o criador de múltiplos "heterônimos". Mas a recente revelação de centenas de inéditos vem ressaltar a importância da obra poética que ele assinou com seu próprio nome.
Poesia 1902-1917 é o primeiro dos três volumes que reúnem os poemas que Pessoa preferiu não atribuir a nenhum de seus heterônimos, como Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis. Até poucas décadas atrás, essa parte da poesia pessoana se resumia ao livro Mensagem e ao punhado de poemas que o autor publicou (e assinou) em revistas literárias, depois incluídos em Ficções do interlúdio. Pouco a pouco, os pesquisadores foram resgatando mais e mais manuscritos do famoso baú dos papéis deixados por Pessoa, do qual também foi extraído o Livro do Desassossego, atribuído ao heterônimo Bernardo Soares.
Só este volume inicial incorpora mais de duzentos inéditos à obra do chamado "Fernando Pessoa ele-mesmo". A organização em ordem cronológica permite ao leitor acompanhar passo a passo os movimentos de um grande poeta em busca de sua voz própria - à medida que ia descobrindo também, em si, as vozes de outros poetas, que ele também criou nesse período.
Como um romance de formação, o livro apresenta desde as primeiras tentativas de um Pessoa ainda adolescente, seu posterior envolvimento com a estética decadente do simbolismo, até a poesia de ruptura e polêmica ligada ao movimento modernista. Em cada uma dessas etapas, vai se consolidando o repertório de temas preferidos do poeta, quase sempre associados às incertezas do "eu", com o "negro sol" da melancolia a raiar por dentro e uma atenta pesquisa acerca dos paradoxos do sentimento: "Sinto que sou ninguém salvo uma sombra / De um vulto que não vejo e que me assombra, / E em nada existo como a treva fria".