ERRATA: "Trincheira tropical", de Ruy Castro
Errata no livro "Trincheira tropical", de Ruy Castro, que narra a Segunda Guerra Mundial no Rio

Foto: Getty Images / Abstract Aerial Art
Tenho obsessão pela escrita simples, mas não sei se é possível explicá-la, porque parece que a necessidade de explicação já cerceia a simplicidade. Algo como o "blues", que Louis Armostrong também disse perder o sentido quando transformado em explicação.
Mas vou tentar.
Para mim, simples é o que não busca provocar um efeito ou resultado. O texto parece acontecer organicamente, sem querer demonstrar proeza ou virtuosismo.
Simples é necessário. Num texto simples, as palavras estão lá porque precisam estar; a sintaxe, as construções, o tamanho das frases, a pontuação, o tempo verbal, tudo se compõe num trabalho de mútua necessidade, em que as formas solicitam umas às outras.
Simples é sem arrogância; sem querer colocar os personagens para dizerem coisas que eles não diriam, mas que o narrador, ou, pior, o autor não resistiu em dizer.
Simples é, diante de dois termos que dizem a mesma coisa, como "derradeiro" e "último", escolher "último" e só usar "derradeiro" quando estritamente necessário, porque o contexto pede.
Simples é usar termos, formas e construções mais raras, preciosas ou elevadas – pretérito mais que perfeito, vocábulos ultrapassados, inversão de substantivo e adjetivo – sempre com parcimônia. Quando assim utilizados, eles realmente designam seu significado e ganham valor pelo pouco uso.
Simples é moderar adjetivos e advérbios e procurar se expressar, o máximo possível, com substantivos e verbos.
Simples é moderar comentários, explicações e descrições, que, na maioria das vezes, servem mais para justificar o autor ou como defesa contra a dificuldade, do que por necessidade mesma do texto.
Simples é mais com menos. E se quiser fazer menos com mais – o que também existe e pode ser ótimo – que isso soe necessário (vide Saramago, Proust e outros).
Simples é com intenção. O leitor intui que cada elemento do texto passou por um processo de reflexão e não há gratuidade ou leviandade no que se escreve.
Simples é revisado. Muitas vezes.
Simples é mais concreto do que abstrato. À frase "passou por grande aflição" prefiro "não conseguiu segurar o xixi".
Simples, etimologicamente, é "sem dobras". Complicado é "com dobras".
Simples não é o contrário de complexo, mas sim de complicado. Um texto pode (e deve) ser simples e complexo, simples e profundo, simples e denso.
Simples não é sinônimo de leve. Simples pode ser pesado e sombrio também (e vice-versa).
Simples é o que possibilita aproximação e contato.
Simples não é o que não é chato.
Simples não significa gostoso e fácil.
Nunca consegui ser tão simples quanto gostaria. É um processo longo e difícil, porque minha tendência é a de abstrair e explicar. Mas vivo tentando e um dia espero atingir a máxima simplicidade de Dorival Caymmi: "coqueiro de Itapuã – coqueiro. Areia de Itapuã – areia". Enquanto isso, vou me virando.
Noemi Jaffe é escritora, professora e crítica literária. Escreveu Não está mais aqui quem falou, Írisz: as orquídeas e O que os cegos estão sonhando?, entre outros. Dá aulas de escrita em seu espaço, a Escrevedeira.
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